2016-06-12

Elogio da Loucura (p.21)

Erasmo de Roterdão
Stultitiae Laus (1509-1511)
(trad. Álvaro Ribeiro)


[XI]

"(...) O próprio pai dos deuses e rei dos homens que com um olhar faz tremer o Olimpo, tem que pôr de lado o raio trífido e o vulto titânico com que aterroriza todos os deuses, tem que usar de máscara, como um pobre comediante, quando lhe apetece... fazer o que faz com frequência... procurar ser pai. Os estóicos presumem de proximidade com os deuses. dai-me um que seja três, quatro ou, se quiserdes, mil vezes mais estóico do que todos os estóicos juntos; neste caso, talvez não consiga que ele corte a barba, insígnia da sapiência também comum ao bode; mas terá que alisar as sobrancelhas, desenrugar a fronte, abandonar os dogmas inflexíveis, atrever-se a dizer inépcias e a fazer tolices. Em suma, é a mim, só a mim, que recorrerá o sábio quando quiser ser pai.
E porque não hei-de falar abertamente convosco, como é meu costume? Pergunto: é com a cabeça, com a face, com o peito, com as orelhas, com as partes do corpo denominadas honestas, que os deuses e os homens procriam? Não é. A propagatriz do género humano é uma parte do corpo tão estulta e tão ridícula, que não pode ser nomeada sem riso. (...)"

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