Jostein Gaarder Sofies Verden (1995) (trad. Catarina Belo)
"- Mas por isso eles não deviam estar tão convencidos. E sobretudo não se deviam rir, porque podem engasgar-se com esse riso.
- Quem? - Hilde e o pai. Não é deles que estamos a falar? - Mas porque é que eles não deviam estar convencidos? - Porque não é um pensamento totalmente impossível eles serem também apenas consciência. - Como é que isso é possível? - Se era possível para Berkeley e para os românticos, também tem de ser possível para eles. Talvez o major seja um fantasma num livro que trata dele e de Hilde, mas também de nós, que somos uma pequena parte da sua vida. - Isso seria ainda mais grave. Assim, seríamos apenas sombras de sombras. - Mas podemos pensar que um outro autor está em algum lado e escreve um livro que trata deste major da ONU, Albert Knag que escreve um livro para a sua filha Hilde. Este livro trata de um certo Alberto Knox que começa subitamente a enviar modestas lições de filosofia a Sofia Amundsen, em Kloverveien 3. - Acreditas nisso? - Apenas estou a dizer que é possível. Para nós, este autor seria um Deus oculto, Sofia. Apesar de tudo o que dizemos e fazemos vir dele, porque nós somos ele, nunca poderíamos saber algo sobre ele. Estamos arrumados na caixa mais interior. Sofia e Alberto ficaram calados muito tempo. Sofia quebrou por fim o silêncio: - Mas se existe realmente um escritor que imagina a história sobre o pai de Hilde no Líbano exactamente como imaginou a história sobra para nós... - Sim? - ...nesse caso podemos pensar que ele também não se devia gabar demasiado. - O que queres dizer com isso? - Ele está lá, e algures no fundo da sua mente estão Hilde e eu. Mas não se pode imaginar que ele também viva numa consciência ainda mais elevada? Alberto acenou afirmativamente com a cabeça. - É evidente, Sofia. Também isso é possível. E se é assim, ele fez-nos ter esta conversa filosófica para indicar essa possibilidade. (...)" |
2016-05-02
O Mundo de Sofia (p.317)
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