La Misteriosa Flamma Della Regina Loana (2004)
(trad. Simonetta Neto)
"(...) Nós temos diversos tipos de memória. Uma chama-se implícita, e permite-nos executar sem esforço uma série de coisas que aprendemos, como lavar os dentes, ligar o rádio ou fazer o nó da gravata. (...) Quando a memória implícita nos ajuda, nem sequer temos consciência de que recordamos, agimos automaticamente. Mas também há uma memória explícita, pela qual recordamos e sabemos que estamos a recordar. Mas esta memória explícita é dupla. Uma é aquela que agora temos tendência para definir como memória semântica, uma memória pública, que nos permite saber que uma andorinha é uma ave, e que as aves voam e têm penas, mas também que Napoleão morreu quando... quando o senhor disse. E quanto a esta, parece-me que o senhor a tem em ordem, aliás, porventura até de mais, pois verifico que basta dar-lhe um input e começa a relacionar lembranças que definiria como académicas, ou a socorrer-se de frases feitas. Mas esta também é a primeira que se forma na criança, a criança aprende cedo a reconhecer um carro, um cão e a formar esquemas gerais, por isso, se um dia viu um pastor alemão e lhe disseram que era um cão, dirá cão também quando vir um labrador. Pelo contrário, a criança leva mais tempo a elaborar o segundo tipo de memória explícita, a que chamamos episódica ou autobiográfica. Não é de imediato capaz de se lembrar, suponhamos ao ver um cão, que no mês anterior esteve no jardim da avó e viu um cão, e que é ela mesmo quem viveu as duas experiências. É a memória episódica que estabelece o nexo entre o que somos hoje e o que fomos de outro modo, ao dizermos eu, estaríamos a referir-nos apenas ao que sentimos agora, não ao que sentíamos antes, que se perderia, justamente, no nevoeiro. O senhor não perdeu a memória semântica mas a episódica, ou seja, os episódios da sua vida. (...)"
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