Thomas Mann Der Zauberberg (1924) (trad. Herbert Caro)
"Mas, eis que vai acontecer qualquer coisa a respeito da qual, o narrador fará bem exprimindo a sua própria surpresa a fim de que o leitor não se espante, de sua parte, além do que é razoável. Com efeito, ao passo que o nosso relatório referente às três primeiras semanas de permanência de Hans Castorp ali em cima - vinte e um dias no pino do verão a que esta, segundo as previsões humanas, devia limitar-se - devorou extensões no espaço e no tempo, o que confirmava bastante bem a nossa própria mal disfarçada expectativa, a descrição das próximas três semanas da sua visita a esse lugar exigirá apenas tantas palavras e tantos momentos quantas folhas, páginas horas e jornadas aquele relatório ocupou; num abrir e fechar de olhos - como já se pode prever - liquidaremos e sepultaremos estas três semanas. Talvez isso pareça surpreendente; e, todavia, está segundo as regras e responde às leis que vigoram para quem narra e para quem escuta. Porque é da regra e corresponde às ditas leis que o tempo se torne para nós tão longo ou tão curto que, em relação à nossa experiência, se alongue ou reduza exactamente como a aventura do herói da nossa história, o jovem Hans Castorp que o destino surpreendeu de modo tão inesperado. E pode ser proveitoso prepararmos o leitor, em presença deste mistério que é o tempo, para outros milagres e fenómenos que iremos encontrar em companhia de Hans Castorp. Por enquanto basta que todos se lembrem da rapidez com que decorre uma «longa» série de dias para o doente que os passa de cama, como doente. É o mesmo dia que se repete sem cessar; mas, justamente por tratar-se sempre o mesmo dia, parece, no fundo, pouco adequado o termo «repetição». Melhor seria falar de identidade, de um presente imóvel ou de eternidade. (...)" |
2014-08-13
A Montanha Mágica (p.192)
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