Thomas Mann Der Zauberberg (1924) (trad. Herbert Caro)
"(...) quando se presta atenção ao tempo, ele passa muito devagar. (...) (...) Não pode dizer-se assim (...) o tempo não tem nenhuma realidade. Quando nos parece longo, é longo, e quando nos parece curto, é curto, mas ninguém sabe na realidade a sua verdadeira extensão. - Não tinha o hábito de filosofar, mas nesse momento sentia-se impelido a fazê-lo. Joachim replicou: - Como? Não. Porque medimos o tempo. temos relógios e calendários, e quando um mês pára, terminou para mim, para ti e para todos os outros. - Espera um pouco - disse Hans Castorp, levantando o indicador à altura dos seus olhos turvos. - Achas então que um minuto é tão longo como te parece, quando tomas a temperatura? - Um minuto é tão longo... dura tanto tempo quanto necessita o ponteiro dos segundos para dar uma volta completa ao mostrador. - Mas esse tempo é muito diferente, conforme a sensação que experimentamos. E de facto... eu digo: de facto - repetiu Hans Castorp, apertando o indicador contra o nariz, com tanta força que chegou a torcer-lhe a ponta - trata-se de um movimento, de um movimento no espaço; não é? Presta atenção. Medimos o tempo portanto, por meio do espaço. É, por consequência a mesma coisa do que medir o espaço com o auxílio do tempo, o que fazem somente as pessoas absolutamente desprovidas de espírito científico. De Hamburgo a Davos são vinte horas; sim, de comboio. Mas a pé, quantas horas são? E no pensamento? Nem um segundo! - Escuta - disse Joachim. - Que mosca te mordeu? Parece-me que te tornaste um pouco bizarro cá em cima. - Cala-te! Hoje estou a pensar com muita lucidez. Que é o tempo afinal? - perguntou Hans Castorp, comprimindo o nariz com tamanha violência, que a ponta se tornou branca e exangue. - Queres dizer-mo? Percebemos o espaço com os nossos sentidos, por meio da vista e do tacto. Muito bem! Mas que órgão possuímos para perceber o tempo? Podes responder-me a essa pergunta? Bem vês que não podes. Como é possível medir-se uma coisa da qual, no fundo, nada sabemos, nem sequer uma única das suas características? Dizemos: o tempo passa. Está bem, deixa-o passar. Mas para que o possamos medir... Espera um pouco! Para que o tempo fosse mensurável, seria preciso que decorresse de um modo uniforme; e quem te garante que é assim? Para a nossa consciência, não é. Somente o supomos, para a boa ordem das coisas, e as nossas medidas, permite-me que to faça notar, não passam de convenções..." |
2014-08-04
A Montanha Mágica (p.70-71)
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário