António Gedeão Obra Poética [Poemas Póstumos] (1983-2001)
"Poema das coisas
Amo o espaço e o lugar, e as coisas que não falam. O estar ali, o ser de certo modo, o saber-se como é, onde é que está, e como, o aguardar sem pressa, e atender-nos da forma necessária. Serenas em si mesmas, sempre iguais a si próprias, esperam as coisas que o desespero as busque. Abre-se a porta e o próprio ar nos fala. As cortinas de rede, exactamente aquelas, a cadeira onde a memória está sentada, a mesa, o copo, a chávena, o relógio, o móvel onde alguém permanece encostado sem volume e sem tempo, nós próprios, quando os olhos indignados nas pálpebras se encobrem. Põe-se a pedra na mão, e a pedra pesa, pesa connosco, forma um corpo inteiro Fecha-se a mão, e a mão toma-lhe a forma, conhece a pedra, entende-lhe o feitio, sente-a macia ou áspera, e sabe em que lugares. Abre-se a mão, e a mesma pedra avulta. Se fosse o amor dos homens quando se abrisse a mão já lá não estava." |
2015-07-06
Obra Poética (p.163)
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