2015-08-15

D. Quixote de la Mancha (vol.I, p.526-527)

Miguel de Cervantes Saavedra
D. Quixote de la Mancha (1605)
(trad. Aquilino Ribeiro)


"(...) Embora o fim de tais livros seja o entretenimento, não sei bem como o podem conseguir, inçados como estão de tantos e tão desaforados disparates. O deleite, que é uma emoção subjectiva, promana do sentimento de beleza e harmonia que a vista ou a imaginação experimentam, Tudo o que encerra em si fealdade ou desproporção lhe é adverso. (...) Se me responderem que estes livros são adrede compostos com o carácter de ficção e mentira, portanto alheios a escrúpulos no que respeita a verdade, observarei que a mentira é tanto mais perfeita quanto mais ares dá de real e tanto mais agradável quanto mais se aproxima da natureza. Para que se tornem recomendáveis, hão-de as fábulas, puramente imaginativas, falar ao entendimento de quem as ler, com tornar acreditável o impossível e humanizar as monstruosidades. Será preciso que mantenham os ânimos em suspensão, e fascinem, arrebatem, divirtam, suscitando igualmente a admiração e o deleite. Dificilmente logrará satisfazer a estes requisitos o autor que fugir da verosimilhança e da imitação, tópicos essenciais da beleza literária. (...)"

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